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Elemento de estudo



Discurso do Senador Cristóvam Buarque sobre a importância do orçamento


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Dia 20/05/2005. Bloco/PT - DF. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, sem querer abusar do tempo porque já estamos a esta hora aqui, não posso deixar de continuar um debate que, a meu ver, é agradável e, eu diria, rico, quando vimos os debates desta semana inteira no Senado.

Quero, em primeiro lugar, dizer que posso estar completamente errado, mas não estou incoerente. Agradeço à Senadora Heloísa Helena por ter lembrado isso. Em 1998, escandalizei o meu Partido ao defender que, se eleito, o Lula deveria manter o Malan por 100 dias. Hoje, digo que, se por acaso, Deus nos livre, o Presidente Lula perder, o próximo Presidente precisa manter o Palocci por 100 dias pelo menos. E vou dizer que isso é uma reflexão que me põe à esquerda da Senadora Heloísa Helena. Sabe por que, Senadora? Porque a minha crítica ao Governo Lula hoje, do meu Partido, é que mesmo com essa política econômica poderíamos ter uma política educacional melhor, porque temos orçamento. Se quisermos tocar em privilégios, temos os recursos. Veja bem. Para fazer a revolução educacional, que venho defendendo sob o nome de Federalização da Educação Básica, precisamos de R$7 bilhões. O Orçamento tem 700. Ainda que tivéssemos a parte que vai para pagar a dívida por não ter condições, supondo, de renegociar, só há dinheiro para isso.

A verdade é que defendemos aqui a diminuição da taxa de juros, que não vamos conseguir, porque não depende do Senado, e não discutimos a política orçamentária. Hoje, revolução se faz na política orçamentária. A sierra maestra, hoje, é a Comissão de Orçamento e não estamos botando roupa de guerrilheiro para tomar aquela Comissão de Orçamento. É ali onde dizemos para onde vai a riqueza do setor público, que, neste País, já é elevadíssima pela imensa carga fiscal existente.

Quero lembrar que a África do Sul teve um presidente revolucionário, o Presidente Mandela, que não mexeu na política econômica. O Presidente Mandela manteve a política econômica dos brancos porque não tinha outra, mas fez a revolução. A revolução da África do Sul foi uma revolução legal: negros e brancos passaram a poder andar na mesma calçada.

Penso que, hoje, a revolução brasileira seria pobres e ricos entrarem na mesma escola. E isso é possível com R$7 bilhões, que este Senado talvez não se debruce para alocar.

Li que, dentro de mais algumas semanas, vai chegar aqui o Fundep, que vai alocar R$1 bilhão, no outro ano R$2 bilhões, R$3 bilhões e R$4 bilhões. Devíamos pedir desculpas por isso e não comemorar, já disse ao Ministro Tarso Genro uma vez. Temos que pedir desculpas - R$154 bilhões, que é o gasto atual em Educação Básica, nos ombros dos Estados e Municípios - por colocarmos mais R$1 bilhão, o que não dá para nada.

Mas penso, Senador, que mesmo com essa política econômica, mesmo com os banqueiros americanos aqui, teríamos dinheiro para fazer a revolução.

Outro ponto, concentrar o debate na economia, de certa forma, é ficar preso ao que dizia o Ministro Delfim Neto, que vamos ter que crescer para depois distribuir. Hoje, dá para distribuir mesmo sem crescer. No Haiti não dá, mas no Brasil, sim. Já tem o que distribuir neste País. Para mim, distribuir não é pela renda, mas pelo acesso aos serviços.

Por isso que tivemos a discordância no salário mínimo. Volto a insistir que o aumento que se pode ao salário mínimo é pequeno para dar um efeito, mas uma boa escola para os filhos, acabar a fila nos hospitais, colocar água e esgoto em todas as casas, isso é possível, e isso custaria no Brasil em torno de R$40 bilhões, um programa de erradicação da pobreza em 10, 15 anos. E R$40 bilhões é possível, mas se não for, aí sim traremos a diminuição do superávit fiscal. Mas ao invés de começar a reduzir o superávit fiscal, que pode terminar servindo para comprar mais aviões, para justificar armas, aumento de salário nosso, prefiro que não baixe o superávit. Se vai reduzir o superávit para ir para os mesmos que há 500 anos ganham renda neste País, inclusive nós, porque fazemos parte dessa minoria, para mim tanto faz deixar o superávit ou não. No entanto, se são necessários R$40 bilhões para erradicar a pobreza e o único lugar para se tirar é do superávit, aí vou ser aliado na briga para diminuir o superávit. Mas, invertendo a ordem da justificativa, não é diminuir o superávit porque é grande, mas diminuir o superávit porque ele não permite atender às necessidades dos pobres.

Para concluir, quero dizer que, hoje, o neoliberalismo deixou uma brecha muito pequena para aqueles que querem mudar a realidade. E considero que é a brecha do social, especialmente da educação, no resto estamos amarrados. Por exemplo, rompimento unilateral, hoje, Senadora, é uma temeridade, a não ser quando não tem mais jeito, como é o caso da Argentina, que não fez uma ruptura unilateral, a Argentina fez uma ruptura social, interna e econômica muito grave, pois não tinha como pagar e disse: não vamos pagar mais. No caso do Brasil, isso traria conseqüências muitos graves.

Mas, insisto, se quisermos nos debruçar no Orçamento, que vai chegar aqui em breve, prontinho, para aprovarmos, sem nem saber o que se está aprovando, como foi no ano passado, com seriedade, com lupa e olhos do povo, com um pé na aritmética e o outro na utopia, há recursos, sim, para dar um grande salto social no Brasil. Esta é minha maior crítica ao Governo Lula: não estar dando esse salto social, mesmo com uma economia que já o permite.


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